Sem verba pública, independente e impecável


Alexandre Reis - NOVO, SP

É possível fazer um grande filme sem dinheiro de incentivos? Essa obra mostra que sim.

Em Setembro de 2015, o MinC (Ministério da Cultura) escolheu o filme “Que horas ela volta?” para representar o Brasil na edição de 2016 do Academy Awards, o popular Oscar. A grande surpresa, no entanto, estava em um dos finalistas da seleção oficial do Ministério.

O número de filmes brasileiros lançados no período foi próximo a uma centena. Desse grupo, 26 se candidataram, mas apenas 8 figuraram na etapa final da escolha feita pela comissão do MinC. Para surpresa de muita gente, um desses filmes foi feito sem recursos de incentivos federais, estaduais ou municipais, provando que não é preciso gastar grandes quantias para se fazer grandes filmes.

O nome do filme é Alguém Qualquer, produzido pelo Latin American Film Institute.
O filme conta a história de Zé, zelador e artesão. Homem simples e trabalhador que ao conhecer a personagem Jandira descobre o amor no mesmo momento em que se vê diante da morte.

Para quem está acostumado a ver filmes brasileiros, assistir a esse filme é uma experiência rara: aqueles longos minutos em que aparecem na tela os logos de dezenas de patrocinadores simplesmente não existem.

Mas… não seria loucura fazer um filme sem nenhuma verba pública? Não é arriscado? Não pode dar prejuízo aos realizadores? A experiência de Alguém Qualquer prova que não.

Feito com baixo orçamento e recursos da própria produtora, o filme coleciona contratos de distribuição. Além de salas de cinema em diversas capitais (como São Paulo, Porto Alegre e Rio de Janeiro ), canais como FX, MTV, AXN, Prime Box Brazil e Sony exibiram o filme. Serviços on demand como Net NOW e Looke (serviço de vídeos da Saraiva) também. Isso sem falar em companhias aéreas como Air France e Emirates.

Além de contratos, o filme coleciona também prêmios. Foi laureado em festivais internacionais como BLIFF (Boston Latin American Film Festival, que acontece na Universidade Harvard), Sedona, Logan e California Film Awards, entre outros. A crítica teceu elogios. A jornalista cultural Beth Pacheco falou ao vivo no Globonews Em Pauta que o filme merece ser assistido e que é “impecável, excepcional”.

Mas quais as vantagens de se produzir um filme sem incentivos fiscais? São muitas. Primeiro, a independência total que os autores tem, afinal, não precisam se preocupar em agradar a uma banca que analisa os projetos de acordo com um jeito próprio de ver a arte. Segundo, o tempo economizado tanto antes quanto depois do projeto, pois não é necessário preencher todos os documentos e etapas burocráticas que um projeto exige, e essas são muitas! Terceiro: poupa-se stress. Tanto o stress de ser ou não autorizado pela banca para produzir a obra quanto o stress de depois ter que bater na porta de dezenas de empresas torcendo para que alguma aceite bancar parte do filme.

Mas atenção: para um filme assim ter sucesso, é preciso também aumentar a produtividade de cada membro da equipe. É preciso ter uma equipe pequena, mas que seja capaz de fazer coisas grandes. No caso de Alguém Qualquer, o diretor e protagonista Tristan Aronovich também é roteirista, editor, compositor e produtor da trilha sonora, a atriz Amanda Maya, co-protagonista, também acumula a função de diretora de arte, figurinista e produtora de lançamento.  Outra atriz do filme, Luciana Stipp, é também produtora executiva. E assim ocorre com todos os membros da equipe: nenhum deles faz uma coisa só, todos são multitask.

Alguém Qualquer não é a primeira experiência de membros do Latin American Film Institute com longas sem incentivos fiscais. Na década passada a equipe já havia feito o longa Sem Fio, que tinha Nasi e Leopoldo Pacheco no elenco, além de trilha sonora da banda Teatro Mágico, exibido no canal Warner. A produtora também fez o filme Jogo do Copo, longa de baixíssimo orçamento que se destacou no festival Ventana Sur e foi exibido nos canais Sony, AXN e Warner. No momento, a produtora finaliza Black & White, longa bilíngüe com elenco internacional.

O exemplo mostra que é possível sim fazer um grande filme no Brasil – sem verba pública, independente e impecável.

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Alexandre Reis é publicitário e microempreendedor.  Aprendeu na prática a desconfiar do Estado em todos os aspectos e acredita na vocação empreendedora do brasileiro e no potencial do indivíduo.

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